Recordações de 2022

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Foi um ano que aconteceram  muitas coisas  bacanas e interessantes que me deram ânimo mesmo diante  de um contexto de tantas incertezas ,vicissitudes, dificuldades financeiras , gente grosseira, sem respeito, barbárie, desajustes e desequilíbrios emocionais e uma atmosfera sombria devido a um ser nefasto e “persona non grata” – e seus comparsas -que estava sentado na cadeira da Presidência da República.

No mês de setembro recebi  o Titulo Honorífico de Cidadão Sumeense, um reconhecimento do meu trabalho e respeito pela minha pessoa. E  participei de uma mostra de fotografias e depoimentos sobre Distonia em duas estações de metrô em São Paulo que foi organizada pelo Instituto Distonia Saúde.

No mês de Novembro, comemorei a vitória de Lula para Presidência da República. Afinal, bons ventos e boas energias estão chegando neste país depois de um período sombrio vivenciado por todos brasileiros em decorrência de um “ex-presidente” que apresenta ainda indícios fortes de traços de personalidade disfuncionais e mau-caratismo.

Na verdade, o segundo  semestre de 2022, especificamente,  foi cheio de emoções  e desafios. Algumas  coisas boas, muitas doenças  e limitações  na sobrevivência em todos os aspectos.

Eu me lembro que no ano passado consegui  ler cerca de 10 livros – bem menos do que anos anteriores – sobre comportamento e filosofia. Eu me ocupei em estudar o Taoísmo, o espiritismo, a macrobiótica,  os transtornos mentais e a psicopatologia na perspectiva psiquiátrica e psicanalítica; me aprofundei  nos estudos  do Capacitismo e nos Transtornos do  Espectro Autista numa perspectiva da Neurodiversidade, assim como, participei do estudo dos livros de Êxodo e Levítico numa perspectiva espírita e ainda tive fôlego para debruçar-me com a leitura  do Srimad Bhagavatam e estudar os Hinos Daimistas com o intuito de entender a nossa jornada de peregrinação enquanto  seres imortais, compreender os conflitos  da criatura  em relação  ao Criador e, bem como, me aprofundar no conhecimento do meu próprio ser num trabalho constante e evolutivo tendo como base a participação nos Trabalhos do Santo Daime. Em 2022, pudemos reiniciar os rituais desta Santa Doutrina depois do período de isolamento da pandemia da Covid-19.

“Essa é a grande tragédia da dita civilização atual. Embora sejamos avançados em ciência e tecnologia, somos primitivos no que diz respeito a experimentarmos espiritualidade, relacionamentos amorosos e genuína felicidade. A civilização ocidental não apenas pariu a tecnologia, mas também a maior destruição que o mundo já viu. Isso inclui a destruição do meio ambiente, o colapso dos valores sociais, a extinção de culturas antigas e a morte do amor, da felicidade e da compaixão, com um grande aumento do individualismo egoísta. Portanto, tecnologia não é algo suficiente para uma sociedade pacífica e harmoniosa. Precisamos de valores espirituais e sabedoria para nos guiarem no uso da tecnologia de modo que esta seja benéfica, e não destrutiva.”  (Indradyumna Swami)

Eu me recordo  que participei de  pelo menos quatro cursos relacionados ao meu trabalho promovidos pelo SUS: Protocolo de Manejo Clínico do Coronavírus (COVID-19) na Atenção Primária à Saúde; Prevenção da Violência contra a Criança e Adolescente;  Água,  Saneamento e Promoção de Higiene nas Unidades de Saúde para a Prevenção  e Controle da COVID-19; e uma Capacitação sobre o Controle da Tuberculose e o Cuidado com a Hanseníase.

Com relação  a rotina de trabalho,  continuei atendendo a população NASF-AB e as pessoas com transtorno mental severo e persistente no CAPS I – Estação Novos Rumos, assim como no Consultório particular em Sumé. Participei da II Conferencia Municipal de Saúde Mental em abril e participei do PSE (Programa de Saúde na Escola) ministrando palestras sobre a Cultura de PAZ nas escolas do município.

Com relação a Distonia percebi que a doença agravou-se consideravelmente. Adquiri  uma tendinite no ombro esquerdo devido a Câimbra do Escritor e uma Espondilose (redução da amplitude dos espaços intervertebrais entre c3-c4, c4-c5, c5-c6 e c6-c7)  em curso na coluna cervical devido a postura inadequada e hereditariedade. Fazem mais de 2 meses que sinto dores intensas e uma limitação maior da psicomotricidade fina.

Com relação a neurodiversdade, aprendi a conviver e me realocar melhor com o universo dos neurotipos.

Com relação a Comunidade Distonia, perdemos a amiga e Defensora da Distonia Pamela Sloate, autora do Blog Chronicles Of A Dystonia Muse.

Com relação aos Blogs, consegui dá uma inovada mas não tive ânimo  para escrever novos artigos…

Apesar das dificuldades e limitações  financeiras e de saúde, tenho boas recordações e tive aprendizados significativos que contribuíram para minha jornada de vida. Sobrevivi as adversidades… E, portanto, eu sou grato a algumas pessoas  que me ajudaram de alguma forma como a minha  mãe,  a minha companheira  Lena, aos meus irmãos, assim como, àquelas enviadas pelo acaso para me proteger  de algum infortúnio no decorrer do ano. Por fim, agradeço por estar na Santa Doutrina do Santo Daime e trago uma oração em forma de poesia intitulada: Agradeço, Senhor:

Agradeço, Senhor
Quando me dizes “não”
Às súplicas indébitas que faço,
Através da oração.

Muitas daquelas dádivas que peço,
Estima, concessão, posse, prazer,
Em meu caso talvez fossem espinhos,
Na senda que me deste a percorrer.

De outras vezes, imploro-te favores,
Entre lamentação, choro, barulho,
Mero capricho, simples algazarra,
Que me escapam do orgulho…

Existem privilégios que desejo,
Reclamando-te o “sim”,
Que, se me florescem na existência,
Seriam desvantagens contra mim.

Em muitas circunstâncias, rogo afeto,
Sem achar companhia em qualquer parte,
Quando me dás a solidão por guia
Que me inspire a buscar-te.

Ensina-me que estou no lugar certo,
Que a ninguém me ligaste de improviso,
E que desfruto agora o melhor tempo
De melhorar-me em tudo o que preciso.

Não me escutes as exigências loucas,
Faze-me perceber
Que alcançarei além do necessário,
Se cumprir o meu dever.

Agradeço, meu Deus,
Quando me dizes “não” com teu amor,
E sempre que te rogue o que não deva,
Não me atendas, Senhor!…

Do livro Antologia da Espiritualidade, de Maria Dolores, obra psicografada pelo médium Francisco Cândido Xavier.

Amós e as injustiças sociais

 

Quando eu vejo uma pessoa com intenção de se candidatar a um cargo político sempre me vem  a seguinte questão: “será que esta pessoa está interessada, realmente, no bem-estar e na comodidade da sociedade, no desenvolvimento humano e na administração do serviço público em favor da população ou preocupado meramente com interesses particulares como  obter benefícios e oportunidades de crescer em termos de poder, riqueza e domínio?”. Neste sentido, podemos dizer que a ganância e desejo pelo poder; a corrupção; as diferenças sociais; a luta contra o domínio hegemônico de ideologias dominantes; os privilégios e distinções não são realidades exclusivas de hoje. Na época do profeta Amós já existia tudo isso que estamos vivenciando hoje no nosso país e muito mais: tribunais a favor dos ricos, discriminação, carestia, cobrança de impostos exorbitantes, avareza, vida de luxo e ostentação as custas da exploração da população mais carente e desprovida…  Na verdade, quem envereda nesta seara deve fazer uma reflexão dos seus reais propósitos dentro de uma perspectiva ética. Não dá mais para acreditar em tanta farsa e invencionice! Este modelo de política que representa classes, grupos, conveniências precisa ser repensado. 

De acordo com os historiadores, por volta do ano 760 A.C., o profeta Amós que era um vaqueiro, agricultor e cultivador de sicômoros  (um fruto comestível) vivia em Teqoa (Técua), nos limites do deserto de Judá, perto de Belém passou a ser considerado o profeta em favor da minorias e contra as injustiças cometidas pelos governantes da época. Este homem simples conhecido como um dos profetas menores residia neste povoado que ficava situado a menos de 20 km ao sul de Jerusalém.  Indignado com tanta injustiça na região, ele deixou sua vida tranquila e foi anunciar e denunciar as injustiças sociais cometidas contra os mais pobres e mais fracos, durante o reinado de Jeroboão II  no Reino de Israel Setentrional (787-747 AC) e no Reino de Ozias em Judá (781-740 AC), que existiam já naquela época. De acordo com a literatura sagrada, naquele período, um leão começava a rugir: era o divino que colocava em polvorosa todo um regime de iniquidades.

Menos de um século antes da missão, ensinamentos e pregações de Amós, tinha acontecido no Reino de Israel Setentrional um golpe militar, promovido por um antepassado de Jeroboão II, o general Jeú, que, ao romper os acordos com os vizinhos, jogara o país em profunda dependência, especialmente, da grande rival Damasco, que era governada pelos Arameus. O Reino de Israel Setentrional levou muito tempo para recuperar a sua autonomia. E isto começou com o rei Joás, pai de Jeroboão II, que governou entre 797 e 782 AC. Conta a história que o reinado de Jeroboão II (783 – 743 AC) ao se recuperar da ditadura militar tornou-se uma época aparentemente gloriosa para o Reino de Israel Setentrional que ampliava seus domínios e enriquecia, entretanto, o sistema administrativo, o que provocou a concentração da renda nas mãos de poucos privilegiados com o consequente empobrecimento da maioria da população e endividamentos dos pequenos agricultores. Estes ficavam tão endividados que chegavam à escravidão para pagar suas dívidas. Os tribunais, que teoricamente deveriam defendê-los da exploração dos mais poderosos, bem pagos por quem podia, decidiam sempre a favor dos ricos.

Nesse contexto, o luxo dos ricos insultava a miséria dos oprimidos e o esplendor dos cultos disfarçava a ausência de uma religião verdadeira. O que não é diferente de hoje com a ostentação dos templos e a ambição pelo poder e riqueza do homem pós-moderno. Desta forma, Amós denunciava essa situação com a rudeza simples e altiva e com a riqueza de imagens típicas de um homem do campo. A palavra de Amós incomodava porque ele anunciava que o julgamento de Deus iria atingir não só as nações pagãs, mas também, e principalmente, o povo escolhido já que se consideravam pessoas corretas, honradas e de bons costumes religiosos, mas na prática era pior do que os pagãos. Amós não se contentava em denunciar genericamente a injustiça social, ele denunciava especificamente:

  • Os ricos que acumulavam cada vez mais, para viverem em mansões e palácios (3:13-15; 6:1-7), criando um regime de opressão (3:10);
  • As mulheres ricas que, para viverem no luxo, estimulavam seus maridos a explorar os fracos (4:1-3);
  • Os que roubavam e exploravam e depois iam ao santuário rezar, pagar dízimo, dar esmolas para aplacar a própria consciência (4:4-12; 5:21-27);
  • Os juízes que julgavam de acordo com o dinheiro que recebiam dos subornos (2:6-7; 4:1; 5:7.10-13);
  • Os comerciantes ladrões e os atravessadores sem escrúpulo que deixavam os pobres sem possibilidades de comprar e vender as mercadorias por preço justo (8:4-8).

No livro de Amós, podemos ver denúncias contra as nações vizinhas como Damasco, a nordeste; Gaza, no oeste; Tiro, a noroeste; Edom, a sudeste e Amon e Moab no leste, por suas crueldades entre si e até mesmo, o mais extenso deles, contra Israel. Há, também, nos seus discursos, reprovações contra Judá e Israel, por sua idolatria e alienação coletiva. E ainda, podemos ver nos capítulos de 3 a 6 condenação a Israel por sua hipocrisia, a injustiça social, o orgulho e as falsas promessas de segurança da população.  Tudo isto se parece com o nosso contexto atual? Comportamentos político-sociais como ditadura militar, apropriação indébita e peculato, propina, enriquecimento ilícito, mentiras, interesses, partidarismo são peculiares ao tempo de hoje ou já era um costume característico desde aquele época remota?

Se as pessoas ricas de hoje construíssem como as pessoas do tempo do profeta Amós, certamente os elefantes já estariam extintos. Um sinal de riqueza era ter decorações com marfim nas paredes em suas casas. Amós 3.15.

Pois é. De acordo com Dionísio Pape,  os crimes de Israel apontados por Amós, uma pessoa simples, sem interesse de enriquecer através de cargos políticos são os seguintes:

  • “Vendem o justo (tsaddîq) por prata”: desprezo ao devedor; “E o indigente (‘ebyôn) por um par de sandálias”: escravização por dívidas ridículas;
  • “Esmagam sobre o pó da terra a cabeça dos fracos (dallîm)”: humilhação/opressão dos pobres;
  • “Tornam tortuoso e injusto o caminho dos pobres (‘anawim)”: desprezo pelos humildes;
  • “Um homem e seu filho são levados à mesma punição”: opressão dos fracos (das empregadas/escravas);
  • “Se estendem sobre vestes penhoradas, ao lado de qualquer altar”: falta de misericórdia nos empréstimos;
  • “Bebem vinho daqueles que estão sujeitos a multas, na casa de seu deus”: mau uso dos impostos (ou multas).

Amós, com os termos tsaddîq (justo), ‘ebyôn (indigente), dal (fraco) e ‘anaw (pobre), designa as principais vítimas da opressão na sua época. Sob estes termos Amós aponta o pequeno camponês, pobre, com o mínimo para sobreviver e que corre sério risco de perder casa, terra e liberdade com a política expansionista de Jeroboão II. É em sua defesa que Amós vai profetizar:  “ouvi esta palavra vacas de Basã, que estais no monte de Samaria, que oprimis os pobres, que quebrantais os necessitados…”. O apelo por justiça é o tema mais conhecido deste livro, porque evidencia a condenação de Deus aos que ficaram ricos através da corrupção. A partir desse contexto  é difícil dizer-se cristão, não é? Onde é que fica o exemplo prático? Enriquecendo às custas dos impostos da população tão indefesa? Discriminando os mais fracos e excluídos? Roubando, mentindo, disseminando o ódio, a falta de compaixão, a tirania, etc.? Mentiras e mais mentiras…   Para ser eleito e não perder as regalias, vale tudo! Considerando este contexto, fica muito difícil dar crédito aos discursos e promessas de pessoas candidatas a cargos políticos diante de tanta ganância, alianças ambiciosas, falta de honestidade, politicagem e manobras maquiavélicas. Aqueles eram tempos tão difíceis e sombrios quanto os de hoje? Parece que tudo se repete num novo formato.

De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto.  Rui Barbosa

Todas estas características dos governantes da época de Amós delineiam o homem não virtuoso na perspectiva socrática que é aquele caracterizado como indecente, corrupto, corrompido e desonesto. Para Sócrates as pessoas deveriam concentrar os seus esforços em serem virtuosos para si mesmos, seus familiares, amigos e para a comunidade a que pertencem, pois, a virtude deve ser conquistada também por todo o grupo humano, pela polis. Assim, segundo o filósofo, a melhor forma do homem virtuoso viver é esforçando-se pelo desenvolvimento da sua razão e do seu conhecimento e não buscando somente riquezas materiais que geralmente desviam o homem do caminho da virtude. Segundo ele, a virtude, portanto, é o bem mais precioso que a pessoa pode ter. 

O homem virtuoso, na minha opinião,  deveria ocupar todas as esferas da sociedade e principalmente a política. Nesta perspectiva, viveríamos numa sociedade mais harmoniosa, mais igualitária e justa,  menos egoísta e que garantisse os direitos humanos de todos.  Um político virtuoso e humanitário seria, portanto, antônimo do conhecido “politiqueiro” e um cidadão de bem seria aquele não corruptível! Esta é a ideia primordial e o grande desafio. Mas para isto, é preciso avançar nos valores morais, na qualidade das relações pessoais e conduta do homem na sociedade; na mudança deste contexto degradado das instituições  como a política que mais parece um balcão de negócios desabonando a dignidade humana, no zelo pela coisa pública, pelo Bem Comum (?), visando o desenvolvimento da comunidade em detrimento dos interesses particulares e, enfim, não permanecer na repetição dos mesmos padrões ancestrais de modelos primitivos de vida.

E para que isto aconteça é imprescindível o envolvimento de todos na construção de uma vida melhor e próspera para todos. Segundo o jornalista Sebastião Nery, só a participação  consciente da sociedade pode exigir políticas públicas fundadas na construção de uma realidade mais justa e com oportunidades iguais para todos. Todos que fogem da política e do supremo ato de lutar pelo interesse comum, garantem a sobrevivência e vida longa para os dilapidadores do interesse público.

“As funções públicas não podem ser consideradas como sinais de superioridade, nem como recompensa, mas como deveres públicos. Os delitos dos mandatários do povo devem ser severa e agilmente punidos.” Robespierre (1793).

Bibliografia:

ALMEIDA, João Ferreira de.  Bíblia Sagrada. Versão Revista e Atualizada.  2ª edição. Sociedade Bíblica do Brasil. 2008. Barueri  – SP;

PAPE, Dionísio. JUSTIÇA E ESPERANÇA PARA HOJE: A Mensagem dos Profetas Menores.  Primeira Edição. ABU EDITORA. 1982. São Paulo – SP.

 

O Espelho do Homem

 

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No Dia Internacional do Homem – 19 de novembro, eu trago um  hino de Alex Polari  intitulado “O Espelho do Homem” que gostei muito. Ele problematiza com seu estilo lírico o comportamento masculino e sutilmente as relações de poder estabelecidas com o semelhante.

Para ser Homem é ser justo
Franco, leal e amigo,
Assim o Mestre mostrou
Esse tornou tão querido

 

Não é fácil ser homem
Se você acha que é
Lembrem  do  nosso modelo
Meu bom  Jesus de Nazaré.

 

Muitos pensam que Homem
É ser brabo e orgulhoso
Como se fosse virtude
De nos fazer mais viçoso

 

Alguns não mantiveram
Sinceridade com os outros
Fingem ser mais não são
E falam mal do irmão

 

Se disser e não for
Muito pior vai ficar
Quebrou com a palavra do Homem
Que Homem não pode Quebrar

 

Se você mexe com vício
Se arrepende mané
Que homem que se vicia
Um bom exemplo não é

 

Homem que é Homem se humilha
Pra na verdade estar,
E poder bem compreender
Aonde o Daime mostrar

 

Para ser Homem é ser justo
Franco, leal e amigo,
Assim o Mestre mostrou
E se tornou tão querido.

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Vivendo na Escuridão e Fora de Controle

a escuridaoQuando era criança, eu nunca entendia o motivo pelo qual eu tinha tanta dificuldade para escrever. Eu não sabia porque a minha alfabetização e aprendizagem da escrita era algo tanto doloroso quanto sofrido. Eu não entendia porque eu não conseguia controlar minhas mãos no simples ato de escrever.

Tudo parecia fora de controle. Comecei a ver a minha vida desmoronar antes de crescer.  Eu só percebia que algo estava errado dentro de mim…  Não conseguia controlar nada. Eu não entendia e ninguém me explicava nada. Muitas coisas aconteceram. Com o tempo, tudo piorou…   Na verdade, eu não sabia que algo errado estava  acontecendo na biologia do meu cérebro, ou seja, no processo de envio de sinais para as células nervosas que controlam os músculos envolvidos no ato de  escrever e usar as mãos ao executar pequenas tarefas.

A maioria da minha vida, eu  vivi na escuridão; sem diagnóstico… Só há cerca de 15 anos atrás é que tive um diagnóstico correto. Daí,  passei a entender melhor o que estava acontecendo. Saí, em parte, do escuro, mas ainda não consegui sair totalmente da escuridão porque não consigo  ainda ter o controle. O esforço sempre foi grande para entender e buscar um alívio para o sofrimento fora de controle…

Hoje, eu entendo que o que se passa dentro de mim é  “um processo caracterizado por uma neuroplasticidade excessiva do cérebro, levando a  aprendizagem da programação motora à anormalidade”, nas palavras da neurologista francesa Drª Marie-Helene Marion  no seu artigo “Mental imagery and dystonia“. Com esta definição e o diagnóstico correto  apareceram, de repente, focos de luz entre nuvens escuras… Mas, ainda, continua faltando o comando da situação: o domínio das mãos.

Na busca incansável para sair totalmente da escuridão, eu encontrei um artigo interessante que me fez sentir um pouco esperançoso. O artigo entitulado “Nouveau rebondissement sur la maladie neurologique: découverte pourrait aider les patients souffrant de dystonie, maladie de Parkinson, plus  fala de uma pesquisa desenvolvida na Universidade de Michigan – Estados Unidos que faz uma reviravolta nas descobertas desta doença neurológica no tocante a entendê-la melhor sobre a biologia básica da distonia, trilhando um novo caminho para desvendar os mistérios da doença e descobrir novos tratamentos.

Neste momento, eu fiquei excitado e motivado por uma esperança para dá, finalmente, o segundo passo: ter o controle das minhas mãos, dos meus braços para sentir o gosto de como é escrever normalmente. Ter o prazer de usá-las para executar pequenas tarefas como “acenar, usar talheres, ensaboar-se, etc.” sem incomodo e sem sofrimento.

Será uma Luz no final do túnel escuro? Será que as nuvens escuras vão começar a dissipar-se? Não sei…  Tomara que sim, pois estou farto de tantos conflitos, tantos tratamentos sem sucesso, tanta confabulação na Comunidade Distonia… e de está fora de controle.

PS.: Drª Marie-Helene Marion mora atualmente em Londres, já foi membro ativista da AMADYS e continua no ativismo pela conscientização da distonia com seu blog Infodystonia.

        Por favor, não compartilhe este artigo com pessoas que não entendem o significado disto. Este “post” foi feito exclusivamente para a Comunidade Distonia e busca conscientizar a todos sobre o projeto: “Esforço Global pela Cura da Distonia“.

Distonia – Minha companheira “Quasímodo”!

Um membro assíduo num grupo de apoio aos pacientes com distonia numa pequena cidade Alemã descreve aqui a sua vida com muito humor em relação à sua doença que é a distonia.

Ela compara a distonia a Laughton Quasímodo que é o personagem central do romance medieval “O Corcunda de Notre Dame” de autoria do poeta romântico francês Victor Hugo, publicado em 1831.

Quasímodo nasceu com uma notável deformação física: uma enorme verruga que cobre seu olho esquerdo e uma grande corcunda. De acordo com o livro, este personagem habita o campanário da Catedral de Notre-Dame, afastado da sociedade e temido pelos habitantes locais.

Na verdade, Quasímodo é um indivíduo monstruoso, é uma aberração. É bom frisar que ele não tem distonia. Mas, achei interessante a metáfora do colega que escreveu o texto abaixo. Ela faz uma relação com este personagem para falar de sua crise existencial com as posturas de um corpo com distonia.

Laughton Quasimodo

A.S. começa sua crônica com as seguintes palavras:

Antes de tudo, devemos ter uma maneira mais positiva e branda para conviver com as limitações…

Então … Vamos ver a doença de outra maneira, tá certo!

Atualmente, eu tenho um outro significado dela.

Para que você entenda logo é preciso ficar claro, antes de tudo, que:

Ela não é minha parceira e eu estou muito longe de  amá-la.

Mas eu vou tolerá-la, temporariamente.

Eu posso aceitá-la, por instantes.

Ela nunca vai me deixar, provavelmente. É extremamente leal e não tem nenhum interesse  de separar-se de mim.

A este respeito, ela  não me  fornece muita coisa boa.

Digamos, então eu tenho que me acostumar com isso…

Deve ser por que ela seja como  uma  companheira de vida grudada ao meu lado e provavelmente permanecerá para sempre. Que chato!

Um outro ponto é que ela precisa de um nome, é claro!

Minha parceira, eu  batizei de ”Quasímodo” porque ela garante que o meu corpo tenha posturas bizarras e de forma extremamente excêntrica, atípica e não natural.

Executa movimentos sem minha permissão.

Me faz sentir um vivo Quase morto…

Ninguém sabe de onde “Quasímodo” veio, mas ela já é uma Quase realidade, mesmo sendo uma quase raridade…

Também não se sabe a língua que fala.

Meu idioma, ela não fala de qualquer maneira.

Isto tem uma vantagem:  em um dia ruim com ela e sobre ela eu posso queixar-se sem que ela  entenda.

A desvantagem, no entanto, é que eu não posso argumentar com “Quasímodo”.

Não posso se comunicar. “Quasímod(a)” não é muito cooperativa e, portanto, não está interessada em aprender o meu idioma.

Assim, eu tento agora compreendê-la, Quase elegantemente, como língua estrangeira.

Uma vez que não tenho nem livros, nem  outros materiais de aprendizagem, eu faço apenas  progressos muito lentos.

Por conseguinte, levo provavelmente ainda um tempo considerável para tentar se comunicar com “Quasímodo”.

Pelo menos para mim, é tanto trabalho gasto  em vão que me faz sentir-se frustrado…

Conflitos vêm… Conflitos vão! Sinto-me só…

Será que meus esforços valerão a pena?

Finalmente,  a minha companheira de vida fiel irá provavelmente  sempre ficar comigo.

Como é importante que eu aprenda a se comunicar com ela – a distonia –  de forma  Quase perfeita.

Bem, se você tem uma inquilina com um tempo longo de vida dentro de você, ela tem direito a habitação.

Você tem que de algum modo organiza-se com ela  – mesmo se ela, como “Quasímodo”, seja cada vez mais intrusiva.

Portanto, faz sentido para o tempo ver se esta inquilina não é só irritante à vida,  mas, também, tenha algo que implica em  positividade.

Minha  “Quasímod(a)” é, de fato, em parte, uma desviante, uma incapacitante, uma Quase aberração, uma cadela tortuosa – mas ela também é uma professora.

Ela ensina a diferença entre a dor e o sofrimento.

Para entender melhor  ambos, ela abre uma perspectiva diferente sobre o mundo e a vida.

Essa é a coisa positiva da minha parceira.

Todo mundo tem que suportar seu burro (sua burra) de carga, talvez até mesmo vários…

Eu tenho outras burras de carga – além da minha  “Quasímod(a)”.

Mas, eu confesso que é, muitas vezes, desagradável ​​para mim mesmo

Afinal de contas, ela não quer perder o contato.

“Quasímod(a)” tem me causado dor, mas ela não  não me matou…

Eu repreendo e insulto   “Quasímod(a)”, mas eu ainda não a consegui eliminá-la.

Nós – eu e “quasímodo” – não podemos mesmo matar um ao outro, nós poderíamos apenas compartilhar e erradicar o que quer que seja…

Assim, nós preferimos fazer, a maior parte do tempo, uma conveniência ou ter um diálogo, mesmo que seja forçado,entendeu!

Acredito que nós – eu e minha companheira – provavelmente, nunca iremos ser amigos.

Quasimodo

A vida continua – mesmo com deficiência!   Foto de A.S.

Texto enviado pelo amigo Franz Kramer.   Tradução do alemão e adaptação:  HB – Eu mesmo.

O Lado Sombrio da Civilização

TVVivemos num mundo complexo cheio de contradições, oportunidades e embates. Estive lendo alguns textos interessantes nos últimos dias que trazem uma reflexão sobre estas questões  e sobre  nossa civilização cujas relações pessoais estão baseadas cada vez mais no individualismo, no consumismo desenfreado e numa necessidade fútil  de mostrar para o outro o poder de consumo que se tem. A seguir, destaco alguns autores que falam das consequências deste modo de vida da nossa sociedade.

Vivemos num universo cheio de pessoas ao nosso redor, porém estamos sós, preocupados somente conosco, com nossa sobrevivência, com nosso sucesso e com nossa imagem. E nesta guerra vale tudo: ignorar, escantear, pisar, ridicularizar, provocar, desrespeitar, roubar e se mostrar. O lema é: “quanto mais tenho, mais quero” Vivemos no mundo da “avareza” com preocupação com bens materiais e rótulos.

O consumismo de bens e ideias é a palavra mágica.  Estamos conectados 24 horas com o mundo. Fazemos amizades, compras e resolvemos a nossa vida, inclusive fazemos nossa feira usando a internet. O mundo está mais acessível através da globalização, da internet. Mas, por outro lado, estamos cada vez mais distantes uns dos outros. Vivemos no mundo da soberba e da cobiça desmedida conforme diz Rosemeire Zago.

Interessante é que até as mídias sociais   tem se tornado um espaço válido para as pessoas   mostrarem o seu poderio de consumo para o outro, exibindo através de fotos os seus bens e o que está consumindo no momento. Nesta “sociedade do espetáculo“, como diz o filósofo francês Guy Ernest Debord, a organização social se expressa neste tipo de dispositivo virtual  reproduzindo o  modo de vida vigente. A “imagem” passa a ser essencial nesta prática do ser para ser visto e não do ser por existir, de acordo com Orlando Senna.  Segundo o psicanalista e sociólogo Jackcson César Buonocore no artigo  A Superexposição da Felicidade, “no mundo atual, a felicidade é sinônima de consumo. Compra-se para tentar conseguir nos objetos consumidos o que é mais desejado para ser feliz e mostrar na internet.”

Esta maximização e ânsia compulsiva pelo consumismo traz implicações sérias para o ser humano e a civilização.  Neste aspecto, Leonardo Boff faz uma reflexão interessante no seu artigo “Estamos à beira da total auto-destruição?”   As consequências de tanta gente vivendo nesta lógica no mundo atual são as mais diversas: escassez das fontes de águas e de combustível, falta de alimentos e de energia… a extinção da terra.

Outro problema grave decorrente desta organização social baseada no individualismo são as chamadas relações de “liquidez” onde não se mantém por muito tempo em um mesmo estado. Tudo está sempre mudando, conforme afirma o sociólogo polonês Zygmunt Bauman. Ele afirma numa entrevista o seguinte: “Parece que o caminho para a felicidade passa, necessariamente, pelas compras. E as pessoas querem comprar os produtos e rapidamente descartá-los, substituindo por novos. Isso representa grande desperdício de recursos naturais do planeta.”  Enfim, tudo se demancha no ar, inclusive as relações sociais que passaram a ser descartáveis, também.

Um terceiro ponto que me chama atenção e gostaria de comentar é que em nome do consumismo e do poder  vale tudo, inclusive cometer delitos e crimes. Estamos cansados de ver políticos envolvidos em escândalos e “falcatruas” em nome do enriquecimento fácil e compulsivo. Estamos cansados de ver e ser vítimas de vários delitos  na nossa sociedade decorrentes da preocupação pela sobrevivência egoísta… Neste aspecto, o filósofo australiano Peter Singer afirma que  a sociedade em questão perdeu o controle de si mesma, que as pessoas não têm mais a noção exata de certo e errado e que  vivemos um enfraquecimento dos valores éticos na sociedade atual.